CAVALEIRO ANDANTE – UMA REVISTA PARA TODOS OS GOSTOS
Nota prévia: O aparecimento do Cavaleiro Andante desferiu mais um rude golpe nas esperanças de sobrevivência d’O Mosquito, já a debater-se com muitas dificuldades graças à concorrência do Mundo de Aventuras, desde meados de 1949. E a verdade é que a mais antiga revista juvenil dessa época apenas logrou resistir aos seus dois poderosos rivais durante alguns meses, mesmo depois de ter mudado novamente de formato, aumentando o preço e voltando à periodicidade semanal, já perto do fim.
O Cavaleiro Andante, nascido em 5 de Janeiro de 1952, foi uma das mais emblemáticas revistas da história da BD portuguesa, em cujas páginas desfilaram, durante 556 números, histórias e heróis inesquecíveis, criados por autores portugueses, espanhóis, franceses, belgas, ingleses, americanos, italianos e holandeses, com destaque para grandes séries como Capitão Audaz (Kapitein Rob), Sexton Blake, Tintin, Blake e Mortimer, Lucky Luke, Astérix, Jerry Spring, Chevalier Blanc, Buck Danny, Dan Cooper, Michel Vaillant, Modeste et Pompon e outras, que consagraram entre nós a popularidade da moderna escola franco-belga, encabeçada por Hergé, Morris, Jacobs, Jijé, Uderzo, Franquin, Macherot, Graton, Tibet, Funcken, Weinberg, Hubinon, Craenhals, e revelaram outros excelentes autores como Pieter Khun (Capitão Audaz), Roland Davies (Sexton Blake), Christian Mathelot (Alarme no Planeta), Dutertre (O Aliado de Sitting Bull), Le Rallic (Capitão Flamberge) e Noël Gloesner (Perdida na Tempestade).
Entre os desenhadores portugueses, a participação mais maciça coube a Fernando Bento, José Garcês, José Ruy, Artur Correia, Fernandes Silva, José Félix e José Manuel Soares. Mas também marcaram presença E. T. Coelho, Vítor Péon, Baptista Mendes e José Pires; e no suplemento O Pajem, publicado a partir do nº 27, ressuscitaram dois heróis de ilustre estirpe, o Quim e o Manecas, que o traço inimitável e o humor fagueiro de Stuart trouxeram de novo à ribalta.
Embora sem heróis recorrentes, a escola italiana do Il Vittorioso surgiu em grande destaque, com magníficas criações de Caprioli (O Elefante Sagrado), Caesar (Dois Amigos e um Aeroplano), Bellavitis (A Grande Reportagem), Albertarelli (Punhos de Aço), Polese (O Segredo da Fábrica nº 2), Ferrari (O Rebelde do Ulster), Boscarato (Na Corte do Rei Sol), Chiletto (A Cidade das Cúpulas de Oiro), Giovannini (O Nome Escrito na Água), De Luca (A Esfinge Negra), Bagnoli (Os Filhos de Brama), D’Antonio (A Mocidade do Rei Artur) e outros, tendo feito aguerrida concorrência às séries belgas, que só começaram a aumentar de importância quando o Cavaleiro Andante iniciou uma nova fase (e mudança de formato) a partir do nº 327. Até então, apenas Tintin, Blake e Mortimer, Cavaleiro Branco, Bessy, Jerry Spring e Dan Cooper (Hélder Pedralva) figuravam entre as grandes vedetas da revista.
Embora em menor número, as histórias de origem americana também despertaram vivo interesse, em especial quatro grandes séries clássicas: Tarzan, Os Sobrinhos do Capitão (The Katzenjammer Kids), Lance e Buzz Sawyer (que no Cavaleiro Andante se trans- formou no aviador luso-americano Fred de Sousa), criadas respectivamente por Bob Lubbers, Rudolph Dirks, Warren Tufts e Roy Crane.
O êxito crescente da edição semanal, dirigida por Adolfo Simões Muller, conduziu a breve trecho ao nascimento de outras publicações de banda desenhada, mas em moldes diferentes, como os Álbuns do Cavaleiro Andante, os Números Especiais (cujo 1º número ostenta uma magnífica capa de E. T. Coelho), a Colecção Oásis, a Colecção Alvo, as Obras-Primas Ilustradas, a revista infantil João Ratão, de periodicidade mensal ou semanal, que publicavam apenas histórias completas.
Sucessor do Diabrete (dirigido também por Adolfo Simões Müller), que se publicou entre Janeiro de 1941 e Dezembro de 1951, o Cavaleiro Andante teve praticamente a mesma duração de dez anos, terminando ingloriamente a sua carreira em 25 de Agosto de 1962… para dar lugar ao Zorro, poucas semanas depois, e à Nau Catrineta (suplemento do Diário de Notícias), onde a BD franco-belga continuou a ocupar lugar de destaque. Mas a ausência mais notada foi a de BD portuguesa, sobretudo no Zorro, que continuou a apostar (embora sem grande sucesso) em heróis como Tintin, Astérix, Ric Hochet, Jerry Spring e Lucky Luke, e nalguma BD francesa, inglesa e italiana.
Concorrente do Mundo de Aventuras, que lhe sobreviveu ainda durante muitos anos, o Cavaleiro Andante publicou também separatas com jogos e construções de armar, teve suplementos como O Pajem, Andorinha, Bip-Bip e Desportos, e ofereceu valiosos brindes aos seus leitores, através de sorteios semanais, organizou concursos (dando automóveis como prémio), fomentou a criação de clubes de fãs e disputou com o seu maior rival animadas partidas de futebol, em campos pelados mas com jovens jogadores equipados a rigor, cujas habilidades no dribla e remata operavam, para gáudio da nume- rosa assistência, um nítido equilíbrio de forças.
Como se no terreno do jogo o brio desportivo procurasse igualar os êxitos e triunfos averbados por cada um dos rivais no campo editorial, onde o duelo prosseguia, renhido de parte a parte, com os olhos sempre postos nos progressos e nas tácticas “ofensivas” do adversário. Acabou por vencer, não o melhor, mas o que soube adaptar-se mais rapida- mente às exigências dos seus leitores, aos novos padrões de jogo… isto é, as histórias completas.
Nas imagens (de alto a baixo): página central do folheto-anúncio do Cavaleiro Andante; capa do nº 157 (1955), ilustrada por Fernando Bento; capa do nº 26 (1952), ilustrada por José Garcês; capa do nº 171 (1955), com desenhos de Gianni de Luca; capa do Número Especial de Junho (1953), ilustrada por E. T. Coelho; capa do nº 100 (1953), ilustrada por Artur Correia.